quarta-feira, 12 de maio de 2010

Memórias


Memórias, histórias?


Enquanto esperava à porta do supermercado pela boleia do meu marido, passaram por mim vários rostos, para mim sem nome, que me lembraram outros rostos, alguns com nome.
Rostos, que não voltarei a ver senão talvez, nas viagens da minha memória ou nalguma fotografia amarelecida pelo tempo. Rostos que se confundem nas recordações. Parece-me que é o tio do pai, ou será que é aquele amigo do avô que andou com ele na tropa?
Memórias, histórias, o que nos diz um rosto? Ás vezes tudo, outras vezes nada. Quando é que um rosto deixa de ser um para se tornar no? O que é que faz um rosto? Dois olhos, uma boca, um nariz? Uma expressão, um sorriso?
Olá! Tudo bem? Não se lembra de mim? Estou assim tão diferente? Deve estar, penso muitas vezes, pois não me diz nada – desculpe não estou bem a ver. Ah! Sim desculpe lá, sabe, sou muito distraída, tenho dificuldade em reconhecer as pessoas fora do contexto, balbucio á laia de desculpa. Outras vezes sou eu própria a reconhecer rostos a quem sou eu que nada trago á memória. As vezes, pudera, não os conhecia mesmo, reconheço quando chego a casa, ligo a televisão e lá estão eles. Não admira que não me conhecessem de lado nenhum.
Se pensar um pouco, acho que certos rostos são persistentes, não pelas feições mais ou menos agradáveis, mas simplesmente pelas memórias que nos despertam.
Um gesto, um olhar, um cheiro e clique, eis que desperta algo que rapidamente assume forma de memória, de história. Lembras-te daquela vez que fulano fez…
Naquele instante o tempo volta atrás e a história torna-se vívida, real. Saudade? Não precisamente, apenas trás um sorriso, uma lágrima e depois desaparece, sem deixar outro rasto senão um rosto tão ténue como um retrato carcomido.
Se recordar é viver, significa que vivemos só para recordarmos? Recordamos só para viver? Ou nada disso. Vivemos, ás vezes recordamos. Mas como a memória é selectiva, e muitas vezes mentirosa, há que fazer uma triagem antes de aceitar as memórias, separar as histórias compridas e alindadas, efeitos que o tempo empresta á verdade.Hoje que tanto se fala em memórias falsas, implantadas por profissionais, e por medos ou desejos, será melhor recorrer aos meios que nos proporcionou o progresso tecnológico. O segredo é gravar em CD, com som, para que não se percam os rostos, as vozes (legendar não seria má ideia), só os cheiros não se podem guardar, nem as sensações. Em contrapartida olhar para trás, ter vivido, ter lá estado, ter conhecido, conseguir lembrar, como diria o meu marido: já não é chita!!!

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